Thursday, August 31, 2006

A IMAGINAÇÃO




"Vive dentro de nós sob as aparências mais misteriosas; determina nossos sonhos e devaneios; é o vento enfunando nossas velas, é nossa vida transfigurada.
*
Todos nós sabemos que imaginamos. Se não o fizéssemos nossas vidas seriam demasiado reais. Tão logo a algazarra da vida se vai esvaindo, mesmo que por alguns poucos minutos, redescobrimos esta companheira secreta. Nossa imaginação toma o leme, instalando-se sutil e gentilmente, tirando proveito dessa inércia momentânea, desse retorno ao eu, para erguer as cortinas invisíveis dentro de nós. Ela nos põe diante de um palco no qual se situa o ator. Esse ator somos nós mesmos. O palco e a platéia são uma coisa só. Baseando-nos numa miscelânea da realidade, nas coisas com que nos deparamos todos os dias, em nossos amigos, nos homens ou mulheres que desejamos, entramos em outro mundo.
*
Tentando parecer informais, alguns de nós avançamos um pouco além disso, e procuramos fazer os outros partilharem as imagens, os sons e as histórias que fluem por nosso intermédio. Denominando-nos narradores profissionais, organizamos nossa porção nômade que devaneia, colocamo-la para trabalhar, tratamo-la com dureza, devastamo-la: um tratamento que envolve tanto ódios quanto amores."

A linguagem secreta do cinema.

Tuesday, August 29, 2006

A História de Lily Braun

Composição: Chico Buarque / Edu Lobo

Como num romance
O homem dos meus sonhos
Me apareceu no dancing
Era mais um
Só que num relance
Os seus olhos me chuparam
Feito um zoom
Ele me comia
Com aqueles olhos
De comer fotografia
Eu disse cheese
E de pose em pose
Fui perdendo a pose
Até sorrir feliz
E voltou
Me ofereceu um drinque
Me chamou de anjo azul
Minha visão foi desde então
Ficando flou
Como no cinema
Me levava as vezes
Uma rosa e um poema
Foco de luz
Eu feito uma gema
Me desmilinguindo toda
Ao som do blues
Abusou do scotch
Disse que meu corpo
Era só dele aquela noite
Eu disse please
Xale no decote
Disparei com as faces
Rubras e febris
E voltou
No derradeiro show
Com dez poemas e um buque
Eu disse adeus
Já vou com os meus
Numa turne
Como amar esposa
Disse ele que agora
Só me amava como esposa
Não como star
Me amassou as rosas
Me queimou as fotos
Me beijou no altar
Nunca mais romance
Nunca mais cinema
Nunca mais drinque no dancing
Nunca mais cheese
Nunca uma espelunca
Uma rosa nunca
Nunca mais feliz

Sunday, August 27, 2006

escapulário

"No pão-de-açúcar
De cada dia
Dai-nos, Senhor
A poesia de cada dia"

Friday, August 25, 2006

Tu me falara de uma
catarse que eu deveria viver...
De um choro
desesperado, doído
eu gritaria minha liberdade,
admitiria como minha a luz
que só tu podes ver em mim.
Mas pra isso tu deverias
estar ao meu lado,
de corpo e alma...
Do contrário a quem
mostraria o meu avesso,
só tu poderias
me ver nascer borboleta...
Meu corpo de lagarta
já contém todas as células
e todas as cores de borboleta.
Sou borboleta em potencial,
ainda não posso voar...
Mas o ímpeto de fazê-lo
está profudamente
entranhado
na minha essência
mais secreta.





Thursday, August 24, 2006



Ele me pede para que eu envie meus escritos. Resolvo de fato juntá-los, não são muitos, e entregá-los com muito cuidado, afinal sou eu ali em palavras... algumas digitalizadas, outras desenhadas por minhas próprias mãos. Neles estão contidas todas as minhas contradições e como uma maneira de tocar a realidade e eternizá-las, eu escrevi. Foram sentimentos transformados em palavras que jamais imaginei compartilhar com alguém... porque neles há a imagem do ser humano que eu sonhei, que eu amei e que eu odiei ser. Eles são como me olhar num espelho, onde posso ver todas as minhas faces. Meus escritos confirmam verdades e mentem por mim, dão voz a sofrimentos leves e peso algum ao que de fato importa. Eles mostram um emaranhado de frases numa cabeça latente que desenham um corpo frágil que diante de uma palavra pode se desfazer. Resolvi não enviá-los na minha total covardia.

Wednesday, August 23, 2006

“O homem, quando jovem, é só, apesar de suas múltiplas experiências. Ele pretende, nessa época, conformar a realidade com suas mãos, servindo-se dela, pois acredita que, ganhando o mundo, conseguirá ganhar-se a si próprio. Acontece, entretanto, que nascemos para o encontro com o outro, e não o seu domínio. Encontrá-lo é perdê-lo, é contemplá-lo na sua libérrima existência, é respeitá-lo e amá-lo na sua total e gratuita inutilidade. O começo da sabedoria consiste em perceber que temos e teremos as mãos vazias, na medida em que tenhamos ganho ou pretendamos ganhar o mundo. Neste momento, a solidão nos atravessa como um dardo. É meio-dia em nossa vida, e a face do outro nos contempla como um enigma. Feliz daquele que, ao meio-dia, se percebe em plena treva, pobre e nu. Este é o preço do encontro, do possível encontro com o outro. A construção de tal possibilidade passa a ser, desde então, o trabalho do homem que merece o seu nome.”

(De uma carta de Hélio Pellegrino.)

Tuesday, August 22, 2006

“A vida não tem ensaio
mas tem novas chances
Viva a burilação eterna, a possibilidade
o esmeril dos dissabores!
Abaixo o estéril arrependimento
a duração inútil dos rancores
Um brinde ao que está sempre nas nossas mãos:
a vida inédita pela frente
e a virgindade dos dias que virão!”

Eu vivo perdendo poesia



Eu vivo perdendo poesia
Ela vem como pluma ao vento
Encantada, esqueço de agarrá-la
Só vejo
Só sinto
... e lá se vai a poesia
Nem mãos
Nem papel
Nem caneta
Não há maneira de busca-la para a realidade
Algumas poesias só podem ficar nos sonhos


Monday, August 14, 2006

Como água para chocolate


... despojou-se de suas roupas, meteu-se debaixo do chuveiro, deixando que a água fria caísse sobre sua cabeça. Que alívio sentia! Com os olhos fechados as sensações se tornavam mais agudas, podia perceber cada gota de água fria percorendo-lhe o corpo. sentia os bicos dos seios ficando duros como pedras ao contato com a água. Outro fio de água descia por suas costas e depois caía em cascata na curvas de seus redondos e protuberantes glúteos, percorrendo as firmes pernas até os pés.

Monday, August 07, 2006

“ a nós, gente, só foi dada a maldita capacidade de transformar amor em nada”



Sabe aquela incerteza da qual falava?
Ela me pôs esperando afim de saber
o que é transitório e o que é estrutural em minha vida...
minha pressa tem se transformado aos poucos em consciência,
o que não me obriga a criar teorias sobre nada,
mas a entender o movimento do mundo e senti-lo
como algo que me faz crescer.
Você também pode ver:
o mundo perfeitinho e nós, homens,
estragamos todo esse estado de harmonia
nos permitindo ferir e matar,
justificando muitas vezes esses atos como prova de liberdade.
Alguém já disse que só na ilusão da liberdade, a liberdade existe.
Quem é livre sendo consciente de qualquer mal causado a outro?
Quem pode provar personalidade quando o sofrer
do outro está em jogo?
Há sim teorias modernas e perfeitas do tipo:
"só faço o que eu quero ou não tô nem aí pra ninguém."
Não sei se sorrio ou se choro diante de tanta
arrogância e prepotência...
e nessas horas, mais uma vez, estragamos tudo.
Foto: Marcelo Ribeiro

Saturday, August 05, 2006

Por favor, utilize a passarela!!!

Caminhava a passos largos subindo a passarela do Metrô do Maracanã, saindo da UERJ. Olhando para o lado e em direção ao chão, avisto um senhor quase sob a passarela atravessando a larga avenida. O movimento dos carros não é intenso, porém é constante. À medida que ele anda, eu também ando e acompanho seus passos inseguros... quase por completar a sua travessia, um carro o atinge e ele voa por sobre o vidro, parando imóvel no canteiro. Meu Deus! Eu corro e em tom aflito peço que alguém ligue para a ambulância. Um rapaz que caminhava em direção ao acidentado já o fazia. Desci correndo as escadas no intuito de ir ajudar, no entanto, parei no meio dela, acompanhando de longe a curiosidade dos transeuntes sobre o sofrimento daquele senhor. Meu Deus ajude-o, pedi internamente. Eu ainda imóvel, sem conseguir descer as escadas, tinha uma imensa vontade de chorar e gritar. Os minutos tornavam-se horas diante da espera por socorro.Ele havia morrido? Demorou de dez a quinze minutos o resgate, não sei precisamente. Mas pude acompanhar ainda o despertar daquele corpo imóvel, o senhor voltara a si, expressando uma dor que eu não sei descrever e de certa forma, aliviando a todos. Estava lá, do lado da vítima, o rapaz que dirigia o carro. Aflito e angustiado seguia a orientação dos guardas do Metrô que também foram ajudar, colocando o triâgulo de sinalização. O senhor que acabara de iniciar sua tarde, eram quase 13 horas, estava com suas duas pernas quebradas. Não pude ir embora sem que o tivessem colocado dentro da ambulância. Ficou pra mim o desejo de que eles se recuperem, um do trauma psicológico e o outro do trauma físico. Essa foi uma experiência angustiante.

Friday, August 04, 2006

... de mão estendida.

Com uma vida que deveria ser cheia de sim e não, me deparo com um talvez que me faz repensar todos os planos e sonhos que tive e tenho. O talvez, todos sabem, é mais difícil do que as piores certezas. Mesmo nelas, estão definidos os caminhos ou abismos que teremos de enfrentar. A incerteza te faz parar e acompanhar do mesmo lugar o movimento do mundo.Sem realizar nada. Estou de mão estendida, esperando que algo me tire do lugar porque dentro de mim todos os movimentos se congelaram... talvez com o girar do mundo eu me aqueça, talvez com tua presença entrando por meus poros, trazendo-me um pouco de tua luz, eu possa despertar e pisar forte na roda que impulsiona o mundo e o pare... e prossiga no seu compasso com um caminhar leve ou com passos de uma dança feliz.

Thursday, August 03, 2006

...

"É velho o sol deste mundo;

velha, a solidão da palavra,

a solidão do objeto;

e o chão - o chão onde os pés caminham.

Donde o pássaro voa para a árvore."